Um presente de mãe para filho

A deduzir da lenda, originalmente a "coroa de ferro" fazia jus ao seu nome: consistia simplesmente num fino diadema, que tivera como matéria-prima um dos cravos da cruz de Cristo, encontrada em Jerusalém no ano 321 por Santa Helena, mãe do Imperador Constantino. Após a morte do monarca, no ano 337, a coroa que ele recebera de sua mãe foi recolhida ao templo de Santa Sofia, em Bizâncio - onde lhe teriam sido acrescentados os ornamentos que ela atualmente ostenta. No século VI, o Imperador Tibério Augusto a teria confiado a um embaixador do papo, a fim de ser levada para Roma. E esse embaixador, elevando-se ao trono pontifício no ano 590, sob o nome de Gregório I, teria doado a jóia vinda do Oriente à Rainha Teodolinda dos lombardos, para dar prestígio à basílica que ela fizera construir em Monza.

Dos dois séculos seguintes, nem mesmo as lendas fornecem elementos que ajudem a traçar o roteiro da "coroa de ferro". A partir de dados esparsos, alguns pesquisadores retomam a sua história mais adiante.

Embora em 476 o Império Romano do Ocidente se tivesse dissolvido, a idéia da sua universalidade e perenidade sobreviveu ainda por muito tempo no mundo ocidental. Mais ainda, sobreviveu a idéia do Império Cristão concebido por Constantino, harmonizando os interesses da Igreja e do Estado e fazendo do poder temporal o instrumento da vontade divina, para a cristianização do universo.

No século IX, surge um rei franco batante poderoso para levar avante essa idéia. O Papa Leão III lhe dá pleno apoio, em troca de proteção contra os lombardos. E, no ano 800, segundo um documento da época, "Carlos sereníssimo Augusto é coroado por Deus grande e pacífico imperador, que governa o Império Romano". A "coroa de fero", que fora entregue à rainha dos lombardos, passa à testa de Carlos Magno.

Coroa de ferro, o peso de um reinado

Mas o poder carolíngio não teve longa duração. Após um século, esfacelava-se nas mãos dos descendentes de Carlos Magno. E novamente é a lenda que ajuda a reconstituir a trilha da "coroa de ferro" através do tempo, sugerindo que ela teria passado ao poder de Berengário I, criador do reino feudal da Itália.

A história consegue recuperar o fio da meada localizando, mais tarde, a "coroa de ferro" com um rei alemão - Oto I -, o qual prestara ajuda ao Papa João XII, libertando-o da ameaça do Rei Berengário II, e, em recompensa, fora coroado imperador de Roma em 967. Oto I lançou as bases do Sacro Império Romano-Germânico, que representou a mais impotante instituição de toda a Idade Média. Com poucas exceções, os monarcas do Sacro Império limitaram-se a governar sobre a Alemanha e a Itália, sendo que esta última mantinha a sua identidade política. Por isso, antes de receberem das mãos do papa a coroa de imperador, os reis alemães eram também coroados reis da Itália - com a "coroa de ferro". Alguns desses soberanos verificaram que essa jóia dos italianos pesava mais do que aparentava. Frederico Barba-roxa, que subiu ao trono da Itália em 1158, foi um deles. Cinco vezes teve que empreender expendições à Península a fim de reafirmar os seus direitos imperiais. E na quinta vez foi derrotado pelos lombardos na região de Legnano, só conseguindo a paz através de tratados que deram autonomia às cidades italianas.

outros background

Origens

Uma coroa para muitos reis

Uma coroa em trânsito